André Florido: “A saúde de uma empresa, enquanto startup, nunca está assegurada.”
André Florido: “A saúde de uma empresa, enquanto startup, nunca está assegurada.”
O André Flórido tem 23 anos e terminou a licenciatura em Economia na FEP com a melhor média de sempre do curso. Depois disso, estudou na London Business School, onde terminou o mestrado com a nota máxima. Trabalhou no Citi Bank, mas decidiu voltar para Portugal para fundar a Betmarkets com o Afonso. O ténis é o desporto que nunca pode faltar – incluindo as longas noites a ver jogos do Federer –, além da música, viagens e dos jantares com amigos. O André esteve à conversa connosco e falou da faculdade, do Erasmus, da Betmarkets e de quem gostava de ter conhecido.
Tu estudaste Economia na Faculdade de Economia da U. Porto e terminaste com a melhor média de sempre. Acredito que não tinhas esse objetivo em mente, mas conta-nos como é que foi o teu percurso académico.
Obviamente que isso nunca pode ser um objetivo. Uma pessoa entra na faculdade sem saber muito bem o que vem aí nem os desafios que vão aparecer. A comparação de média é sempre algo discutível, acho que devemos é estar satisfeitos com a nossa performance e percurso e, acima de tudo, nunca descurar tudo o resto que a faculdade tem para oferecer. E uma coisa que eu gostava de focar é: o melhor que a faculdade me trouxe foi fora da sala de aulas. E a todos aqueles que ainda vão passar por esse percurso, eu diria para não se focarem apenas na parte académica, mas tentem também aproveitar ao máximo o que vem de fora – organizações estudantis, clubes desportivos… – tudo isso faz parte da experiência de faculdade e é isso que a longo prazo te vai trazer mais valias.
Tu tinhas gozo enquanto estudavas? Sentias-te bem a estudar e a aprender ou às vezes era mesmo só porque tinha de ser?
Sim, gostava, sem dúvida nenhuma. Fazer os exames já é outra história (risos), mas estudar claro que sim. Quando a pessoa estuda na área que quer e naquilo que quer fazer para a vida, tira sempre algum prazer por acabar um dia a saber mais do que começou.
Depois da licenciatura na Faculdade de Economia da U. Porto seguiste para o mestrado na London Business School, que terminaste novamente com a nota máxima. Trabalhaste em banca de investimento e depois regressaste a Portugal para trabalhar numa startup. O que é que te fez sair de um sítio onde muita gente quer trabalhar para abrir uma startup?
Não vou dizer que desde criança que quero trabalhar em banca de investimento, porque em criança não sabemos o que é isso nem este mundo das finanças. A verdade é que mesmo antes de começar o meu mestrado, sempre soube que queria ter algo a ver com finanças, investimento e empresas. Trabalhar no Citi Bank, em Londres, foi uma experiência tremenda que me deu imensas valências. No entanto, cedo descobri que não me interessaria ficar naquele mundo muito tempo. Em banca de investimento em Londres, tipicamente trabalha-se entre 80 a 100 horas semanais. Se todas essas horas fossem passadas a trabalhar, era muito mau na mesma, mas pelo menos não estarias no escritório à espera que o trabalho aparecesse. Para além disso, senti muita falta do dinamismo e experimentalismo que vivenciei durante a faculdade. No Citi, a atitude normal era “fazemos as coisas desta forma porque alterar pode dar maus resultados” e só me apetecia perguntar “e se acabarem por ser melhores?”.
E como é que surge aí a Betmarkets?
Ainda no início do estágio no Citi Bank, surgiu a oportunidade de vir integrar esta equipa com o Afonso e, já que estive envolvido com empreendedorismo desde a faculdade, sempre quis ter algo a ver com capital de risco, startups, criação de empresas… Portanto, acho que foi uma evolução natural no meu percurso e, como é óbvio fico muito satisfeito por ter tido esta oportunidade e espero estar agora a contribuir para o sucesso da Betmarkets.
Tu és um dos cofundadores da Betmarkets, mas como é que surgiu a ideia de criar a empresa?
O Afonso é o criador desta ideia e o original fundador, tudo porque passou pelos exatos problemas – durante quase 3 anos – que nós estamos a tentar resolver agora. Ele sempre praticou ténis e, de forma informal, gostava de apostar. Os amigos sabiam que ele conhecia muito de ténis e diziam-lhe: “Porque é que tu não fazes isto por nós? Nós damos-te algum dinheiro e tu apostas.”. Ele disse que não, porque as coisas podiam correr mal e não queria ter essa responsabilidade. No entanto, ele sabia que existiam especialistas que vendiam os seus serviços a fazer exatamente isso. Ele juntou algum dinheiro de amigos e familiares, escolheu os especialistas que queria seguir e esses especialistas é que fariam as apostas, mas tudo o resto era manual. Ou seja, o Afonso recebia emails 24/7 e depois só tinha alguns segundos para ativar as recomendações, porque senão o mercado alterava-se e ele já não podia aproveitar. No fundo, ele não tinha vida própria enquanto estava a fazer isso. Os resultados estavam a ser muito positivos, mas não dava para continuar a fazer aquilo. Ele sentiu este problema, sentiu que havia interesse por parte do público em geral e decidiu automatizar esta solução de poder copiar especialistas em apostas desportivas – e é assim que nasce a Betmarkets.
E quando é que te juntas à empresa?
Eu apareço nalgumas conversas de estratégia e direção no início do ano passado, mas o convite formal surgiu em junho. Aceitei-o rapidamente, porque achei muito interessante o produto e os primeiros dados de tração da empresa, interesse de investidores e do mercado. Entretanto a equipa já cresceu bastante, o que é também um ponto muito positivo.
“A saúde de uma empresa, enquanto startup, nunca está assegurada. Isso é um ponto muito importante e é uma das dificuldades, sem dúvida.”
Qual é, para ti, a maior dificuldade de ter uma empresa?
Acima de tudo, o acordar e saberes que tens pessoas a teu cargo e que dependem de decisões tuas e, no caso de errares, essas pessoas podem ter problemas. A saúde de uma empresa, enquanto startup, nunca está assegurada. Isso é um ponto muito importante e é uma das dificuldades, sem dúvida. Por outro lado, é também daí que vem a realização de ter uma startup. Ainda somos os dois bastante jovens, temos muito a aprender e pouco ou nada a ensinar, mas já temos pessoas a nosso cargo e é muito bom sinal dizer que ajudamos pessoas a levar um salário para casa e ter uma vida mais tranquila.
Um objetivo da Betmarkets a curto-prazo?
O objetivo é mesmo lançar o produto no mercado e ter, finalmente, uma versão completamente live. Neste momento, estamos em beta e a ter uma tração muito interessante. Estamos com quase 2 mil utilizadores ativos, sendo que lançamos esta versão em novembro. Mas sim, o grande objetivo a curto-prazo é efetivamente lançar, depois de ultrapassadas algumas questões regulamentares.
E a longo-prazo?
A longo-prazo é mesmo criar no mundo das apostas desportivas um produto completamente racional. Um produto que é analisado estatisticamente, que tem lead indicators (indicadores que não preveem, mas dão uma indicação face à futura performance desse mesmo produto) e coloca-lo ao mesmo nível de outros que têm vindo a aparecer, como é o caso de P2P Lending.
Como é que é um dia normal na vida de uma empresa como a Betmarkets? Existe um “dia normal”?
Com toda a sinceridade, a minha previsão do dia muda completamente entre as 10h e as 12h. Isto é um clichê, eu sei, mas é verdade que não existe um dia normal numa startup. Por causa do background que trago, faço muita análise estatística, análise de back office, mas já me encontrei a fazer legendas para um vídeo, edição de imagem e vídeo… e tudo um pouco.
Na Betmarkets há algum momento da semana em que se encontram todos e definem objetivos e conversam sobre o vosso trabalho?
Sim, isso é muito importante. Nós tentamos que segunda de manhã, a equipa se reúna toda e diga não só o que fez na semana passada, mas também aquilo que planeia fazer durante essa semana. Outra iniciativa que tomamos – e aí dou todo o crédito ao Afonso – é: qualquer pessoa tem a flexibilidade de se voluntariar para ajudar outro noutra tarefa, mesmo que não tenha nenhuma vantagem comparativa para fazer essa mesma tarefa. Se a tarefa for interessante e a pessoa achar que pode trazer valor, qualquer um de nós é livre de colaborar. Isto vai criando raízes de interajuda e colaboração dentro da equipa.
E porque a vida não é só trabalho, fomos até ao Club Sportivo Nun’Álvares – a quem agradecemos a simpática receção. O ténis está presente na vida do André desde os 5 anos, mas há muito mais a descobrir.
Apesar de todos estes sucessos académicos e profissionais, estiveste também em associações e clubes na faculdade e sempre praticaste desporto. Onde é que entra o ténis na tua vida e que parte é que ocupa?
Sempre gostei de desporto, desde miúdo. Comecei a jogar ténis aos 5 anos e, entretanto, passei por futebol, voleibol, basquetebol, hóquei em patins – aí confesso que me fiquei apenas pelos patins e não pelo hóquei –, mas o ténis sempre me foi acompanhando. Agora aos 23 anos, posso dizer que pratiquei ténis durante 17 anos e que foi uma componente muito importante no meu desenvolvimento não só enquanto pessoa, mas também enquanto profissional. O desporto traz-te muitos valores: competição, companheirismo, respeito pelos outros, facilidade para ultrapassar momentos menos bons… Acredito que tudo isso não seria possível se não tivesse passado uma boa parte da minha vida a competir e a colaborar com outros num court de ténis.
Tu participaste nos Campeonatos Nacionais Universitários… Ouvi dizer que conseguiste bons resultados em alguns, é verdade?
Acho que dizer bons resultados é exagerado. Obtive bons resultados quando jogávamos a pares e aí tenho que dizer que, na maior parte das vezes, a outra parte do par é que nos carregava (risos). Mas sim, acho que tive um papel importante numa medalha que conseguimos enquanto equipa, porque estive do lado de fora a dar motivação.
Costumas viajar?
Sim, gosto muito de viajar.
Qual foi a tua melhor viagem?
Posso destacar talvez duas viagens aí: uma de índole mais pessoal e outra mais educativa ou profissional. A primeira foi uma ida à Turquia no ano passado, onde passei 9 dias a conhecer o país. Foi muito bom conhecer culturas diferentes, modos de estar diferentes e também aprender um pouco com um modo de viver que não nos chega cá. A outra, mais numa de aprendizagem, foi uma viagem que tive a oportunidade de fazer com a London Business School aos Estados Unidos. Nos primeiros 7 dias estivemos em Silicon Valley a conhecer empresas e pessoas e deu para conhecer melhor como é que as coisas funcionam do lado de lá, no Santo Graal do empreendedorismo – ainda que eu acredite que no futuro esse Santo Graal se mude para Oriente. A segunda semana foi passada mais em fase de relaxamento com os amigos do curso a viajar pelos parques naturais. Acabamos numa zona bem menos natural que se chama Las Vegas, portanto foi uma semana bem passada (risos).
Tens algum acontecimento na tua vida que te tenha marcado muito?
Aí gostava de frisar dois dias. O primeiro é o 13 de novembro de 2015, o dia do ataque ao Bataclan em Paris. Eu estava em Erasmus na Noruega e tive a infelicidade de assistir a esse momento em direto pela televisão. Foi um momento muito complicado, porque eu vivia com um rapaz que era francês e eu percebi exatamente aquilo que ele estava a sentir. Mas o que eu gostava de ressalvar foi o dia seguinte, porque foi organizada uma marcha pela cidade onde estavam milhares de pessoas a prestar homenagens às vítimas desse mesmo ataque e depois juntamos 25 pessoas a jantar lá em casa – tudo amigos e conhecidos da universidade. Três colegas nossos fizeram questão de fazer uma sobremesa, compraram mirtilos e framboesas para construir a bandeira de França nessa mesma sobremesa – isso marcou-me bastante. Foi um momento bastante emotivo e que me permitiu reconquistar o respeito e a fé que tenho na Humanidade.
Se tivesses de escolher a coisa que tu mais gostas de fazer, o que seria?
Gosto de muito de combinar com amigos e praticar desporto, seja uma futebolada, um jogo de padel ou um jogo de ténis. Se não é isso que mais gosto de fazer, é das coisas que mais gosto de fazer.
Quando eras criança, o que querias ser quando crescesses?
Sempre cresci rodeado de números, por isso sabia que as matemáticas iam estar presentes na minha vida. Um pouco mais crescido, percebi que o que gostava mesmo era criar valores, estabelecer coisas, começar a ver algum produto do meu trabalho e aí escolhi Economia e, posteriormente, Finanças.
Diz-me qual é a tua típica sexta-feira depois do trabalho?
Sexta-feira até ao fim do dia de trabalho é um dia como os outros. Depois do trabalho, e lamento não ter uma resposta muito excitante, mas é jantar com amigos ou com a minha namorada e depois ou vou a algum lado ou vou para casa descansar. O fim de semana também se quer ativo (risos).
Qual é o teu maior defeito?
Podia escolher tantos… Acima de tudo, ainda peco bastante, principalmente a nível profissional, por ser pouco pragmático. Tenho sempre muita necessidade de ter a completa certeza daquilo que vou fazer antes de decidir. No entanto, considero o Afonso uma pessoa bastante pragmática e, por isso, fazemos uma boa equipa.
E qualidade?
Sou uma pessoa bastante resiliente. Felizmente, nunca passei por nenhuma adversidade muito significativa, mas já fui conseguindo ultrapassar algumas dificuldades.
Qual é a primeira coisa que fazes quando acordas?
Mais uma resposta bastante aborrecida… A primeira coisa que faço quando acordo é ir ao nosso Slack e ver os resultados da noite, para ver o impacto no Portefólio que as apostas dos nossos especialistas tiveram.
Se pudesses conversar com qualquer pessoa de toda a História, quem é que escolhias?
Podia ir para vários ramos do conhecimento e da sociedade, mas algo que me intrigou sempre muito foi o espaço. “O que é que nós somos? Porque é que estamos aqui? O que é que aí vem? O que é que já passou?” E aí, Stephen Hawking seria uma escolha evidente. E até toda a sua incapacidade motora tem, com certeza, uma excelente história de resiliência. O meu maior problema nessa conversa seria ter a certeza do que perguntar (risos).
Qual foi o concerto da tua vida?
Quero acreditar que o concerto da minha vida ainda está por vir, mas já tenho boas recordações de alguns. Ver The National no Primavera e Muse no Estádio do Dragão foram, para já, dos melhores concertos que já vi. Ah, e o Roger Waters na Altice Arena.
Qual foi a coisa mais parva que já fizeste na vida?
Essa pergunta era melhor ser feita aos meus amigos… E eles diriam que foi eu fazer longas noitadas não a estudar, não a sair com amigos, mas a ver os Grand Slams do ATP, nomeadamente a ver o Roger Federer. A pessoa no mundo que já me deu mais noites sem dormir foi o Federer. Olhando para trás, reconheço que poderia ter visto alguns jogos em diferido, mas não teria sigo a mesma coisa.